JUNK: funk, jazz e experimentalismo para todos os públicos

Nem todos os músicos entendem de música, quiçá os apreciadores. Isso é dito porque há vários aspectos de se entender a música. Dentre os principais deles estão o fato de fazê-la e o de apreciá-la. O primeiro exige conhecimento óbvio da área, o segundo basta ouvir. Enfim, dito isto vamos ao que interessa neste trabalho do JUNK. Mas, primeiramente conheceremos o projeto.

Trata-se de mais um ‘filho’ da pandemia, pois os músicos Aaron “Dubl A” Seener de Long Island, Nova Iorque e o saxofonista Dale “Dirty D” Pearson de San Diego, Califórnia, ambos dos Estados Unidos, se viram sem opções neste período e foram para o estúdio. Lá surgiu o embrião do que seria o JUNK.

A proposta desde sempre foi atingir a escala cromática que é uma varredura de todas as notas existentes no sistema de música ocidental até que se percorra uma oitava e por aí vai. Sim, pois para a maioria que irá apreciar o trabalho, o resto é história. Eles denominaram essa ousada experiência como ‘narcóticos sônicos’, ‘Sonic Narcotics’, na língua do duo.

“Chromatose” é o fruto disto tudo, e o conteúdo do EP traduz bem o que eles quiseram dizer com ‘narcóticos sônicos’, mas ainda encaixaria termos como ‘viajem sonora’, ‘experimentalismo’, ‘música psicodélica’ e derivados, de tão abrangente que o trabalho é. Mas, não pense estar diante de algo incompreensível ou propositalmente insano, pois aqui é tudo bem pensado.

O JUNK tem como foco a fusão do jazz com o funk, trazendo o baixo como o principal elemento da seção rítmica. O instrumento, que é essencial no funk, é destilado de uma forma soberba, precisa e atende até em partes melódicas. É o grande responsável pelo ‘groove’, afinal a parte percussiva é mais variada, inclusive contando com batidas programadas, que revela um lado eletrônico da sonoridade do trabalho.

Como condutor das melodias, eles optam pelo saxofone, instrumento que compõe os naipes de metais no funk, mas que costuma tomar a frente como solo no jazz. Logo, a mescla proposta está feita, destacando seus elementos principais. Mas, as cinco composições, distribuídas em pouco mais de 16 minutos, de “Chromatose”, não se resumem a isso, e trazem diversos outros estilos em suas entranhas. Afinal, um dos objetivos aqui é atingir todas as notas, não?

Pois bem, a primeira faixa, que dá nome ao trabalho, é um bom resumo do que se encontra no EP. Na verdade, mais do que é feito do que é gerado, pois é a faixa mais versátil, abrangente e com mudanças de andamento. Aliás, é a única com vozes, mas não como elementos principais, e sim como acessórios.

“Chromatose”, a música, começa com o sax ‘nervoso’ e um fundo com sintetizadores psicodélicos. Logo, o ritmo eletrônico e o baixo ‘estralando’ dão a sustentação, enquanto linhas vocais repetem o nome da faixa, em uma rima bem sacada da breve letra. Quando o ouvinte menos espera, guitarras pesadas, beirando o metal, explodem nos falantes, dando a intensidade necessária. Tudo para depois voltar ao ritmo tradicional, incluindo uma bateria orgânica com uma levada ‘bossa nova’ e assim se repetir, até um final dramático, onde o ritmo cai totalmente e a faixa viaja em um clima atmosférico tocado por um teclado e violão. A música conta com participação de Flawless Solace, conterrâneo de Pearson.

Não se preocupe, o ouvinte (leitor) não irá se perder em meio a tantas coisas, basta se situar em uma audição posterior e a música fará todo sentido. Fato é que em três minutos e meio, a faixa título consegue explorar tudo isso e ainda ser um perfeito cartão de visitas do EP.

Mas, é bom destacar que estamos falando de algo prioritariamente instrumental, onde as linhas vocais aparecem apenas como complemento e às vezes até narradas. Logo, estamos diante de músicas extremamente bem tocadas e conduzidas, onde mal se sente falta das vozes.

Outro carro chefe é “No Other Than Dirty D”, com participação de Scott AKA Strap, onde o saxofone se desdobra e mostra sua veia principal, dando conta do recado, enquanto tem suas ações narradas. Em “Blow”, que também conta com Flawless Solace, o funk predomina, com um baixo de linhas consistentes e totalmente explorado, tendo uma levada quebrada e ‘grooves’ a esmo.

Enfim, a dica que fica ao ouvir “Chromatose” é que a mente esteja bem aberta, pois não estamos diante de uma sonoridade que se digira imediatamente. As canções devem ser apreciadas com calma, sentindo os ingredientes, mastigando bem, para que o sabor profundo que elas emanam sejam sentidos com muito gosto.

Depois disto, a digestão será fácil, e difícil será não querer repetir o prato, isso porque o EP se torna no mínimo viciante. O que fica, é que precisamos de mais trabalhos como este, principalmente dirigidos ao público em geral, mostrando boa música composta e tocada. Esplendoroso.

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