Há um poder miraculoso na subjetividade de um indivíduo. Podemos criar um museu particular e quando necessário dividir nossas obras de arte com quem tem afinidade, por exemplo. Sim, em uma simples conversa descobrimos um artista ou dois e nossos achados tornam-se tesouros. Ou ainda, conquistamos terreno em mentes que não admiram determinado gênero, traduzindo com nossas impressões um universo de conjunturas que repartimos com o outro.
E bem, hoje lhes apresento uma junção de satélite natural com uma constelação inteira: Moon and Aries! Trata-se de Jordana Moon, uma cantora e compositora do oeste do Canadá e Tom Aries, um músico, compositor e produtor de sintetizadores eletrônicos da Alemanha Ocidental. A dupla criativa e muito talentosa nos entrega um álbum que ilumina a paisagem, decorando com um bom Electro Pop, Indie Pop, Cinematic Synth Pop, Trip-hop ou Trance, e há muita energia nessas dimensões. Estamos falando de “Break The Matrix”, uma coleção de 9 faixas elaboradas para você dançar, refletir e dar o colorido necessário à vida, como cumpre e aspira à música em seu papel.
Iniciamos a peregrinação por “Illumination Society”. Mas antes de descrever o que me sugere a faixa, preciso trazer uma ideia sobre o título do álbum. E talvez seja isso, ok! Dentro do óbvio! Ou acabei de fabricar uma rota! Vou lhes contar. “Break The Matrix” deseja criar uma passagem para um mundo em liberdade, longe de regras que nos aprisionam e nos mantêm reféns da rotina e de vidas ordinárias. Há tanto para sentir, não acha? E imagino que seja justamente o que propõe a abertura do álbum com “Illumination Society”. A canção transmite essa necessidade de viver intensamente, reflete a angústia de estar preso às convenções, a sentimentos atordoantes, em um mundo que gira em sentido contrário ao que realmente almeja. Enquanto isso, as camadas de sintetizador quebram as paredes, desfilam ondulando teclas, criam um ambiente onírico, cinematográfico, em que podemos arquitetar cenas com perfeição somando à interpretação precisa de Moon: suave e acentuada quando necessário. Entrelaça vocais, ecoa, busca cintilar o espaço exibindo melismas angelicais, estica as palavras; desliza como uma bailarina pela melodia e nos entrega a poesia dramatizando pontualmente com a harmonia. A vibração é levemente sombria e carrega o aspecto de desafio consigo. Começamos em alta definição!
“The Butterfly Effect” compõe uma base rítmica com uma batida profunda, uma batida na proporção exata, outra, quem sabe, descarrilaria um trem. Como assim? Hummm, conhece a metáfora? Sobre um simples bater de asas aqui no Brasil que desencadearia um tornado no Texas? Bom, ainda que a faixa não descreva nada sobre asas e tornados, ela narra algo semelhante: o efeito que a sedução causa. Aqui, se você lançar um olhar, marcar um encontro e beber um bom vinho, lide com as consequências. O caos de alguma maneira se organiza e alimenta os passos seguintes dentro desta relação avassaladora. Há tudo para dar certo e tudo para pegar fogo. E seguindo a lógica de que para toda ação há uma reação, o grande trunfo de “The Butterfly Effect” é sua condução cuidadosamente atraente, que inspira entregar-se ao momento, de sentir aquele arrepio do encontro, da pele com pele, dos diálogos que guardamos em segredo; um cenário único no universo, resultante de todas as escolhas feitas, e agora, episódio conhecido, que não há intenção em mudar. Uau! E ainda não contei a sensação que a melodia configura: nasce como uma percussão hipnótica e nos prende com o que soa como uma linha ofuscante de baixo, entre delicadas e brilhantes teclas, enquanto os vocais macios e enlaçados de Moon atravessam a rua. Os padrões equalizam performance, emoção e harmonia em uma fotografia sensacional!
Seguimos para a terceira faixa e uma memória afetiva cai como um raio nesta sala: estou novamente sentada na calçada, segurando meu walkman, enquanto ouço Ace of Base. “Never For Me” desenha um embalo doce e gentil, adorável de ouvir; emana sensualidade, através da condução vocal da artista, constrói uma narrativa sobre culpa e sentimento e nos apegamos sem medir esforços. A composição harmônica sonhadora cresce na direção em que o lirismo trabalha e a arquitetura da batida ao emprego das texturas, é algo mágico, e particularmente, excelente para apreciar.
“Rescued” calcula a rota para os anos 80 e pulsa com a magia dos sintetizadores. É a trilha sonora que nos encaminha para o desafio de salvar quantos pudermos. Um resgate ao pé da letra; uma brilhante e mágica harmonia que cativa com o tema e desenvolve a melodia com criatividade e sofisticação. Os toques e as texturas grudam como cola, algumas borram o ambiente e permitem a impressão de cordas acrescentando emoções, sem contar na batida incisiva, que sustenta toda a aventura do desafio. Não estamos sozinhos!
“From Another Dimension” chega dançante eprovocativa. Vocais sussurram sobre prazeres que nos levam para outra dimensão; uma jornada incendiária e marcante, recheada com o feitiço de texturas sob a performance dominante da intérprete. A ideia caminha sobre o escape da rotina, uma ponte que atravessamos para satisfazer um desejo e desfrutar daquilo que nos é proporcionado. É importante destacar a atmosfera convidativa que Aries cria: uma tradução exata da intenção do lirismo com volume sonoro, calor e ritmo que demarca seus elementos eletrônicos pontualmente.
Já, “Codes And Circles” abre as cortinas de um ambiente que literalmente entenderíamos como um desenrolar de cenários entre um homem e uma mulher que decidem explorar a vida como dois criminosos. Mas como não canso de dizer que a imaginação é uma das minhas mães, posso entender, também, como uma mensagem um pouco mais caliente, por assim dizer! Uma troca generosa e explosiva de interações entre estas duas pessoas em meio a um público que não percebe o que está de fato acontecendo. E todo esse clima é construído em cima de uma melodia menos acelerada e mais intensa, procura trabalhar os vocais de uma forma mais atmosférica e joga com os sintetizadores, oferecendo a sensação de estarmos em uma pista de corrida, como se estivéssemos em um game completando inúmeras fases.
Na etapa seguinte encontramos uma profundidade tocante em “The In Between”. Poesia, romance e as ondas do mar nos encontram na beira da praia. Mas aqui há um ponto muito interessante, nos sentimos como a água. Há essa sensação. Não só pela indução do lirismo, bem como pela melodia que engata a ideia e a personifica. Já imaginou provocar isso em alguém? Permitir que ela te sinta como se entrasse em cada poro e te filtrasse por completo? É um dos ideais amorosos mais belos que podemos conceber, quando o sentimento une verdadeiramente duas pessoas. A faixa ainda elabora uma percussão linda: iniciamos com passos intensos acompanhados de uma batida que apenas risca a camada e logo as teclas agregam drama ao ambiente, enquanto palavras são ditas para o vento e as ondas deslizam na areia. É possível notar a referência sonora de metais na melodia, a fim de arrematar o clima sedutor e romântico proposto.
“Closer And Closer” sobe e desce a linha de sintetizadores e as luzes piscam, acendem, apagam. É uma paisagem de conquistas cujo objetivo é ganhar terreno. Talvez metaforicamente, a essência de alguém, ou literalmente, um espaço físico. E como tudo na vida, há batalhas que precisamos travar. A canção abriga seus elementos eletrônicos com a tônica do sintetizador provocando o ouvinte, o levando de espaço em espaço, formatando o que fica para trás e construindo uma nova atmosfera em que se possa aproveitar a experiência.
E a surpresa final vem com os vocais principais de Aries. “Losing Control”, última canção, sopra em suas camadas uma poesia belíssima, que nos entrega uma associação de emoções e como não poderia deixar de ser, emerge do âmago em busca de algo que o preencha e o faça sentir vivo. Moon and Aries dividem a apresentação e permitem que as linhas sintetizadas borbulhem uma melodia que capta a ideia e a perspectiva geral do álbum: uma equação que segura nossa mão e nos conduz em uma jornada em busca de sentir e refletir o que realmente importa em estar vivo.
E se pudesse relacionar uma palavra que resumisse essa busca seria a mais substancial de todas: AMOR. Não somente o sentimento direcionado ao romântico, a eterna procura natural do ser humano, mas para o próprio trabalho: oferecer ao ouvinte aquilo que aplicaram e desejam que quem o ouça, sinta. Um olhar mais atento para fora da realidade geralmente atribulada e uma rota para nossa verdadeira essência que pode ser colorida, cintilante, feliz e prazerosa! E não o contrário: chata, burocrática e julgadora.
É um álbum que empenha cada letra e elemento eletrônico com propósito, e não coloca somente em favor da arte, aqui, tem muito mais! O balanço e a harmonia magnética de “Break The Matrix”, combinados com a poesia, guiam o ouvinte por diferentes panoramas e conquista com paixão um local vago no seu coração. Flerta com desafios e projeta sua intenção para além do objeto artístico. Certamente ganha uma vitrine em nosso museu de recomendações.
Ouça neste instante a excelente coleção de Moon and Aries. Vale cada segundo de sua execução.
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