Na música há também alguns estereótipos, e eles não se restringem apenas à obra, mas também ao público. Um deles é o de que música clássica não pode ser ouvida pela massa. Isso é uma ofensa, pois toda arte deve ser apreciada pelo maior número de pessoas possíveis, afinal, não faz mal a ninguém.
Este álbum de Gene Pritsker, compositor, guitarrista, rapper e produtor musical russo que vive em Nova York, intitulado “Only A Game”, pode vir pra desmistificar isso. Não que seja uma adaptação pop ao estilo, mas da forma que é conduzido e direcionado. Isso porque aqui, o trio novaiorquino Wolfgang Schroeder (violino), Paul Cortese (viola) e Alberto Ferres (violoncelo) dá uma abordagem mais simplista, que inclusive chega a nos lembrar momentos de animações antigas, às composições.
Composições que são encomendas de Robert Shannon Fields para escrever música para seu libreto de balé, que ele escreveu décadas atrás na antiga Alemanha Oriental. Olha só a magnitude disso e que é tudo bem desenvolvido com esse trio de cordas, que parece mesmo uma orquestra, tamanha a pompa que eles impõem neste disco.
O mais interessante, no conjunto da obra, é a maneira como conseguem entregar uma sonoridade que mexe com a imaginação do ouvinte. E, pensando assim, isso é uma ferramenta e tanta para as bailarinas que irão performar o trabalho, pois nada melhor que uma música que invade a mente (e a alma), para tirar o melhor de quem dança.
Ainda sobre o conjunto da obra e sua acessibilidade, em “Only A Game”, Gene Pritsker é objetivo em suas composições, o que torna o trabalho ainda mais fácil de digerir, além de prazeroso. E tudo isso, sem dúvidas, vem pelo fato de Pritsker vir do nicho da música popular, saber ver e entender dos dois lados da moeda.
As sete músicas do trabalho estão distribuídas em quase 27 minutos, o que, convenhamos, para um disco de música clássica, é algo bem atípico. Mas, dentro das normas que seguem o estilo, apesar de divididas em atos, ainda se conectam musicalmente, parecendo uma peça inteira. Nada que atrapalhe uma audição plausível.
E é incrível como cada instrumento exerce sua função pontualmente, claro, sem regras, e às vezes tomando protagonismo. Logo, a viola faz a base do trabalho, enquanto o violino conduz a melodia milimetricamente para que o violoncelo dê a vibração na cozinha, mas muitas vezes também quase insere um efeito percussivo às canções.
No primeiro ato, “A Typical German Bar” chega com uma alegria não tão aguardada para esse início, como uma valsa estonteante. Claro, logo dançante, ela parece abrir uma cortina, não só do palco, mas de nossas mentes, mostrando um mundo florido com um sol forte, mas distante.
“The Game Starts” tem o que o nome sugere. É uma canção onde as cordas explodem, o violino fica intenso e a melodia perde um pouco para o caos. Logo, é uma música que impõe seriedade ao trabalho, e convida o ouvinte de vez a imergir na viagem musical que o disco proporciona.
“Tic Tae Toe” é a primeira composição que podemos destacar a influência percussiva do violoncelo, que chega com suas linhas bruscas, enquanto o violino traz viradas impressionantes. Tudo com muito bom gosto e um ar um pouco mais denso, inclusive nas bases do conjunto geral. Essa faixa inaugura o segundo ato.
“The Love Game” é mais uma daquelas que parece trazer a primavera de volta ao mesmo tempo em que é uma das que mais se aproxima de temas de animações antigas. Não pela sua alegria, até porque é uma faixa levemente melancólica, mas por sua condução, cheia de climas e texturas.
Abrindo o segundo ato, um violoncelo quase heavy metal em “A Special Game” invade a alma de qualquer ouvinte, já denunciando o fim apoteótico do trabalho. Este solo é impressionante e intenso, que deixa o ouvinte apreensivo e ao mesmo tempo emocionado.
“Battle”, a mais longa do trabalho com seus quase 7 minutos (não poderia ser diferente), encerra “Only a Game” da forma épica que o trabalho merecia ser encerrado. De início intenso, ela ganha em dinamismo, para depois cair em melodias mais sombrias, no entanto, das mais belas. Que sacada sensacional nesta composição.
O disco ainda conta com uma faixa bônus, intitulada “Love Theme From ‘Only a Game’”, onde a viola toma o protagonismo com um dedilhado e solo de arrancarem lágrimas. Tudo isso depois de viajar em músicas de vários climas e sabores. Na hora que pensamos em respirar, ainda nos resta mais um suspiro profundo, com essa beleza magistral que a faixa bônus proporciona.
O principal efeito que “Only A Game” nos causa com seu fim é a vontade de ouvi-lo novamente, e isso deve ser o objetivo principal do artista ao lançar qualquer disco. Motivar o ouvinte a querer mais. Talvez uma explicação melhor que essa não exista pra definir o álbum.
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