Fazer música com apenas um instrumento é uma façanha, mesmo que por trás disto esteja um talento nato. Mas, quando se há a improvisação, talvez tudo fique mais fácil e o artista deixe fluir naturalmente. É o que acontece muitas vezes, principalmente com artistas inspirados no jazz.
É o caso de PÀPPA D., de Los Angeles, Califórnia. Apesar de vir do olho do furacão de uma cena pop que nunca dorme, ele traz em seu novo disco a inspiração baseada na sonoridade de Nova Orleans. Com apenas um piano, ele consegue destilar diversas facetas do jazz, de uma forma que o ouvinte mais leigo possa compreender.
E tudo naturalmente com doses consideráveis de improviso, do qual, segundo ele mesmo, “este álbum é uma das tentativas mais criativas das quais já tive a oportunidade de fazer parte. Uma viagem improvisada, musical, por uma época diferente. A fusão do meu amor pela música, esse tipo de música e dança.”
Exatamente, “Swing! The CalBal ’23 Session” é um disco que ainda pode pôr o ouvinte a dançar, sobre valsas jazzísticas ou leves blues ao piano, mas também trazer a reflexão, com um som que pode funcionar como um abridor de mentes. Ainda há teores eruditos, que dão uma pompa mais sofisticada ao trabalho.
São quinze composições em quase uma hora de disco, que vão mexer com os brios das almas mais sossegadas, até porque a habilidade de Pàppa chama atenção desde o início. Porém, em momento algum o artista sobrepõe a técnica ao contexto musical.
Uma das maiores inspirações do disco é simplesmente o álbum “Kind of Blue”, de Miles Davis, lançado em 1959, ou seja, a escola já nos cria muita expectativa e o que o musico entrega atende ela de diversas formas, mas ainda nos surpreende pela versatilidade que ele nos entrega.
A começar por “Reminiscin’”, uma composição que abre o disco trazendo elementos que encontraremos durante todo o trabalho. Sofisticada, ela mescla teores do jazz, erudito e blues de uma forma equilibrada, inclusive no seu ritmo levemente cadenciado. É nela que Pàppa dá seus primeiros sinais de virtuosismo. Já em “Day ‘n’ Night” ele nos transporta para os anos 30, onde o piano viajava por caminhos em que o blues e o jazz se entrelaçavam.
“Moody LA” incrivelmente carrega um ar mais moderno e leves toques introspectivos, se bem que neste último contexto a música de Pàppa passa meio que longe. Com um som mais grave, a música tensiona um pouco o ambiente. “After 3AM” é uma composição que faz jus ao seu nome, e quando o artista mais uma vez mostra que sua técnica pode ser benéfica a todo contexto musical. Uma aula de piano.
“Hooked On Swing (Take 1)”, é aqui que o blues retorna e com uma dinâmica maior, além de toda sua quebradeira tradicional. Incrível como ele consegue fazer essa peripécia com um piano! “Waking Up My Feet”, um dos carros-chefes do disco, é mais uma composição onde o contexto de “Swing! The CalBal ’23 Session” é exaltado, com seu jazz contemporâneo e o tradicional tempero blues.
“Oh, But What About The Old Days?” chega para ambientar ainda mais a sonoridade do disco, com seu ar pra cima e diversidade. Enquanto “The Things That Give Me Joy” segue um contexto mais tarimbado, com o ritmo semi-cadenciado. “Hooked On Swing (Take 2)” continua o blues de sua primeira parte, mas com o ritmo ainda mais descarado (no bom sentido) e uma veia mais descolada.
Entrando na reta final, cinco composições que prometem surpreender o ouvinte, que se habituou durante o disco. “The Best Offer” é a primeira música com um ar mais dramático e intimista, talvez a mais sombria de um disco onde obscuridade não é muito bem-vinda.
Já “Shall We?” traz um contexto folk muito interessante, e tem uma condução diferenciada por parte de Pàppa. “FB (F Blues)” tem um nome autoexplicativo. E, mais uma vez Pàppa dá uma aula de piano no blues colocando dúvidas no ouvinte se seu mote é o jazz ou este tipo de som e, convenhamos, que beleza de dúvida. “Just Can’t Help It” traz o ar irreverente novamente, com aquela habilidade típica do pianista norte-americano.
Fechando a trilogia, “Hooked On Swing (Take 3)” vem ainda mais dinâmica e enérgica, transitando praticamente por todo o tempo em que o blues habitou a terra. E “Something From The Old Days” fecha o trabalho de forma primorosa com uma veia mais erudita e sisuda, fazendo com que o ouvinte confirme que valeu à pena ouvir pouco mais de 57 minutos de música instrumental de piano.
Sem dúvidas, “Swing! The CalBal ’23 Session” é um disco perfeito para ambientes requintados, mas também para se apreciar tomando um bom vinho, mesmo em dias mais quentes. Afinal, a musicalidade encontrada no álbum te leva a outra dimensão.
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