Kenton Hall, em primeiro lugar, é um artista versátil: canta, interpreta, escreve livros, dirige filmes; como eu disse: um Artista! Embarcando em carreira solo e ex-líder da banda de rock dos anos 2000, Ist, Kenton Hall agora atende por Kenton Hall & The Necessary Measures e apresenta aos fãs seu recente trabalho: Idiopath, um álbum triplo de 36 canções originais. Inspiração, sensibilidade e muito talento não poderiam resultar em nada menos que uma obra que nos entusiasma e invade nosso coração. Sim! Impossível não detectar a criatividade e paixão pela arte, por aqui, bem como todos seus sentimentos, desabafos, rock…
E seu criador olha para Idiopath e percebe que pode fazer algo diferente! Então, como se não bastasse, o álbum nasce com um irmão gêmeo, Omniopath, onde cada uma das faixas é interpretada por um coletivo incrível de músicos incluindo Steve Nieve (banda de Elvis Costello), lendas dos anos 80, como The Swinging Laurels, e a cantora e compositora escocesa Vivien Scotson. Sensacional, não é?! Ok. Vamos gravar vídeos para as músicas também? E surge Videopath, 36 curtas-metragens que irão compor um longa-metragem antologia em dezembro de 2023.
Mas nossa tarefa é contar ao leitor o que há de bom em Idiopath: uma receita de bolo que possui cobertura, recheio e uma última fatia para experimentar; um conjunto de músicas que chega para mostrar quem é e o que pretende e começa assim: “Keep it simple” e segure as expectativas! Que podem ser de quem nos manda o recado ou mesmo, as nossas próprias. E devo confessar: sinto-me assim na maioria das vezes. Quem ouvir a faixa entenderá suas emoções, terá afinidade com a situação. Cabe em um desejo; um querer ser testado, compreendido e aceito. Respostas com as quais sonhamos, mas, pensando bem, é melhor deixar que o tempo resolva. A faixa abre com dedilhados suaves; uma atmosfera guiada por uma batida calma, combinada as teclas que carregam emoções, cordas sonhadoras e os vocais expressivos de Kenton.
“Maybe”, a segunda canção de Idiopath, tem uma sonoridade que nos conquista facilmente. Cordas sedutoras acompanham a percussão serena e o ambiente prepara exatamente as emoções que propõem: certa aflição, paixão, ciúme, dúvida… Mas não é tudo. O lirismo envolvente ganha espaço, casa perfeitamente com a harmonia, e observamos alguém que almeja ganhar a atenção de outra pessoa; alguém que fará o possível para não perder e reflete sobre a conquista. Uma união de sentimentos e imagens descritas que imaginamos de imediato: cinematográfica e magnética!
Já, “It’s Not Over Yet” começa como quem não quer nada, tranquila, dialogando com as circunstâncias; se der, deu, senão seguimos tentando porque ainda não acabou. Mas a melodia não se mantém apenas na suavidade, também explora o vigor, e Kenton coloca o tom na medida para cada momento. Outro destaque é a agradável apresentação do baixo e suas linhas combinadas as guitarras; chamam nossa atenção. Temos aqui um belíssimo casamento entre The Beatles e The Who, sem contar nas teclas e dedilhados repletos de brilho.
“Careful How You Go” encanta! Melodia, teclas, a percussão carismática; um movimento que acentua a performance mais otimista do artista, aliás, o trabalho vocal nesta faixa está impecável. E o que dizer do lirismo? Conversa com o ouvinte e traz as emoções para perto: é um traço atencioso e no mesmo passo, uma maneira de dizer que sabe como é se sentir de determinada forma porque já passou por aquilo. Uma faixa que repetimos sem cansar! Fascinante!
E se não bastasse a energia de “Careful How You Go”, a canção seguinte é um espetáculo. “I Wish I Had A City” explora o embalo: seu andamento expressivo, quente e o lirismo que vai entregando as cenas à nossa imaginação dão um golpe perfeito em nosso coração. Harmonia e narrativa criando o ambiente exato para renovar as vibrações positivas. Ah, e o convite à dança é irresistível!
“The One That Got Away” tem aquele algo a mais; um ar sessentista deliciosamente proporcional à combinação de cordas e melodias envolventes, acentuadas na medida certa. A mescla instrumental é incrível: observamos ao ouvir a faixa algumas vezes, que camadas deram à canção uma sofisticação indiscutível; o sax exibindo-se lá atrás é um ótimo exemplo. Mas o grande charme é do contra baixo: indiscutível! Os vocais de apoio trazem o brilho para acompanhar Kenton e o resultado em “The One That Got Away” é excelente. Essa música precisa estar na lista de alguma trilha cinematográfica!
E depois desta passagem mais entusiasmada e movimentada do disco um, nossa cobertura do bolo é uma etapa que experimentamos primeiro e pouco a pouco. Automaticamente vai deixando um gosto de quero mais; quero saber o que há a seguir.
Mas antes de pular para a próxima etapa é importante comentar sobre a intensa e tocante “Dumb As A Brick”, música que encerra a primeira coleção de 12 faixas. Gostaria de dizer que ela é mais suave no ritmo, mas intensa na entrega, não só por conta do lirismo, mas também pela harmonia e apresentação do artista. Uma dor visível; mágoa e de certa maneira, um desabafo com determinada pessoa. “Como você tira alguém do seu coração?”, canta Kenton. Aqui, as cordas alcançam uma vibração adequada ao peso dos sentimentos e tudo brilha com a delicadeza dos dedilhados: combinações poéticas e lindíssimas. A batida profunda colabora quando a voz precisa subir o tom, unindo o conjunto instrumental em uma atmosfera de emoções abundantes.
Então, o Disco 2 se apresenta e a fatia do nosso bolo salienta sua essência rock: lento ou rápido, repleto de narrativas e nos levando pelas mãos. That’s More Like It”, título que abre nossa segunda leva, é enérgica. Uma canção que diz o que quer e como quer, e goste você ou não, é assim que as coisas funcionam. Os vocais mais agressivos de Kenton aparecem na faixa e a base rítmica colabora nas explosões dos versos. É honesto, incisivo e não deixa que você se canse com o ritmo. Começamos a todo vapor!
“FFC” revela emoções difíceis, mas que, de alguma maneira, saíram daquele quartinho trancado que não suportava mais ficar sem ver a luz do dia. Poesia tocante, dolorida, que retrata um relacionamento familiar complicado e talvez, muitos se identifiquem. A melodia delicada nos chama atenção de imediato; cordas e dedilhados maravilhosos que nos convidam a preparar o coração para perceber a mensagem sensível. Kenton, enquanto intérprete transparece a dor e indignação por uma vida que aparentemente, nunca foi fácil. “FFC” é substancial!
“My Turn” mostra um coração partido e preocupado em como seguir em frente o menos arrasado possível. A batida acompanha a linha de baixo e soa tão bem, que paramos tudo para ouvi-la. Sem contar na beleza delicada da guitarra com seus riffs. As teclas proporcionam a intensidade necessária para a comovente harmonia e os vocais sentimentais do artista, enquanto vocais de apoio são um charme a mais e a canção nos permite à emoção. Linda faixa!
“We’re Not Talking Much At All” parece um túnel no tempo. A história é um olhar para o passado e de maneira perspicaz a sonoridade da faixa nos traz uma sensação setentista; uma atmosfera composta de batidas suaves, um piano marcante, guitarras e baixo amornando o ambiente e texturas que nos acompanham, no mesmo tempo que nos deixamos envolver: há drama, recordações, um aperto no peito, talvez até arrependimentos.
E exatamente em seguida somos surpreendidos por uma canção sensacional. “Don’t Take My Picture” é uma performance visceral do artista e tudo é grandioso: das cordas dedilhadas maravilhosas aos sintetizadores que carregam a energia no espaço, permanecemos em uma camada de intensidade e recordações com o piano e de sentimentos que se misturam com aflição. Há um crescente de notas distorcidas, como se todas as memórias doessem demais. Que harmonia!
“She Sang” chega como uma balada de vocais trabalhados em dois tons, entre profundidade e superfície. E mesmo que a faixa reproduza momentos de melancolia, carrega uma ternura entre as linhas de seu lirismo que nos comove. A harmonia oferece batidas suaves combinadas ao encanto do piano e exibe junto à base rítmica o embalo do baixo, que colabora para deixar tudo um pouco sombrio, enfatizando o refrão. E temos ainda neste ambiente, guitarra e Ukulele elétrico proporcionando ao ouvinte riffs melódicos.
E neste ritmo sereno e repleto de emoções partimos para a última fatia, agora capaz de olhar para o futuro, mesmo que o passado assombre de várias formas.
E ao constatar defeitos particulares, existe a necessidade de enfrentá-los: “Tell Me One More Time” embarca na ideia de que nossas dúvidas e medos, quando tomam conta, nos deixam perdidos, mas a luta continua. Uma melodia carismática, repleta de dedilhados charmosos, conduzida pela harmonia da batida e teclas insistentes. Aqui, as cordas são destaques marcantes. Tanto quanto em “Sweet”.
Mas a quinta faixa da nossa última fatia, “Sweet”, é tão forte e vibrante que nos arranca suspiros: um roteiro dramático e entregue com sinceridade pelo intérprete; uma narrativa que cena a cena vamos bordando em nossa mente. A música tem uma percussão brilhante, tem guitarras pesadas, uma batida profunda que dita as regras junto ao baixo, texturas cintilantes e teclas acentuadas. Uma canção que reluz seu conceito instrumental e apresentação vocal.
Logo, camadas, sintetizadores, sentimentos, dissabores e críticas se entrelaçam pelas faixas. Histórias que olham para a tristeza e buscam algum conforto traduzindo essas emoções em arte. “Belly Of The Beautiful” traz uma sonoridade marcante e simplesmente, apaixonante. A percussão combinada aos vocais misteriosos e sussurrados oferece uma melodia, de fato, sombria, mas irresistivelmente encantadora.
“The X-Factory” traz uma instrumentação diversificada e exibe uma narrativa rica em detalhes, sobre uma mulher que tenta a sorte de algum modo, pois a vida é sofrida demais. E há com uma crueza no enredo, que o sentimento mais intenso fica por conta da pena, que nos invade, sobre as circunstâncias daquela personagem. A arquitetura da canção exibe banjo, dedilhados encantadores e acordeão colaborando com a base rítmica equilibrada.
“Sad Songs Say Fuck All” vai deslizando sua poesia amarga, enquanto a batida suave procura conduzir linhas de baixo e guitarras tranquilas. E por mais que as esperanças pareçam escorregar pelas mãos, ela está ali, sim, porque a música a faz permanecer. Um honesto agradecimento à música e a importância que ela tem na vida de quem busca ficar em pé. Um ambiente que trilha entre drama e incerteza, mas aposta na receita de cura: “Porque músicas tristes dizem foda-se tudo”!
“In Summation” se encarrega da despedida: breve e emocionante, e também, segurando a bandeira da paz e dedicando a obra a alguém importante. Teclas e cordas dão o tom para a emoção, e Kenton Hall nos conduz para o fim, com um sentimento sincero de dever cumprido e seguramente tranqüilo como no começo, apesar de compreendermos sua visão apreensiva sobre como as coisas acontecem nesta vida.
Mirando o conjunto, deixei que cada canção falasse comigo; contassem-me a respeito deste mundo de altos e baixos. Algumas são de fato, apenas a criatividade prevalecendo, embora não ocultem algum sentimento. Outras são narrativas interessantes; humanizadas, que olham para o espelho e existe um desconforto, mas buscam lidar com a situação, mesmo que com dor pulsando. E descobri um dos segredos da receita: há gotas de uma personalidade melancólica misturadas à espontaneidade carismática! Tudo no ponto.
Kenton Hall & The Necessary Measures olha para o passado e dele tira lições para o presente. E é assim mesmo; só assim evoluímos, não é? E posso dizer: Idiopath é um trabalho para abraçar e ter por perto sempre. Para admirar suas narrativas engenhosas, que nos entregam uma mensagem sobre sentimentos difíceis de colocar para fora, mas que explodem em canções sobre dores, conquistas, amor, raiva: sua alma! É a arte, enquanto remédio para situações difíceis que fogem do nosso controle, colorindo espaços sonoros, agarrando nosso coração.
Um lindo trabalho!
Ouça, neste instante, a excelente obra de Kenton Hall & The Necessary Measures. Boa audição!
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