Lançado em 2024, “Incadescent Grace” preparou terreno para o primeiro álbum da dupla Fundamental Shift, “If Seven Was A Number”. Além deste single, o trabalho ainda apresenta outras nove canções com um perfil musical completamente despretensioso. Quem está por trás deste projeto são os australianos Andrew Muecke (baixo, guitarra, teclados e vocais) e Andy Rasheed (vocal, bateria, pedal steel, knee fiddle, tanpura, spider-bridged resonator e electric lapsteel. Ou seja, são dois multi-instrumentistas de mão cheia. No repertório do lançamento, “Incadescent Grace” vem em primeiro lugar mostrando fluidez na melodia, embora a dupla adote alguma complexidade nas canções seguintes. Falaremos sobre isso.

A música do Fundamental Shift é toda construída em cima de sentimentos introspectivos, sem intenção de ascender para o mundo como pop star. No entanto, seus valores melódicos são preciosíssimos a quem aprecia um bom conteúdo. Ouça, por exemplo, “You Know Better Now” e perceba todas as qualidades de quem faz bom trabalho de forma natural. Todos os vocais, acordes e andamentos nos sugerem calma e leveza, até mesmo a produção soa orgânica. Equilibrar a sonoridade para que não haja nenhuma nuance sobreposta, parece ser um caminho seguido por aqui, pois tudo corre sem picos mais salientes ou intervalos abruptos.
Algumas músicas mais atiradas como “The Crux of Potential” possuem um tipo de expressão diferente, mas não deixam de entregar doçura, pois se há uma coisa que essa banda sabe fazer é trabalhar os climas. Observe que a canção se inicia como um rock clássico dos anos 70, apontando um blues moderno e pontual. O andamento, para complementar melhor a atmosfera, é cadenciado e os licks de guitarra inserem mais elegância à música. Agora, da metade para o fim, o Fundamental Shift investe em elementos psicodélicos deixando a canção mais abstrata subjuntiva. Essa técnica chega a despertar os nossos sentidos

Liricamente falando, “If Seven Was A Number” é um trabalho que te leva a reflexões pelos temas filosóficos nele abordados. “…é um álbum no sentido tradicional. Embora não seja um álbum conceitual, ele tem um arco narrativo e dinâmico. As letras interrogam sensivelmente vários aspectos da condição humana”, explica a dupla. Nesse contexto, alguns aspectos estão relacionados em canções como “I Really Should Do More Dishes”, uma música com o padrão das demais e atua como se participasse de uma transição entre outras do repertório. Aqui, também podemos atentar à parte cantada que não exibe muitas técnicas de voz, mas contém bons encaixes.
Uma das execuções mais versáteis deste disco é “Just These Crumbs” por sua construção mista. Isso nos faz lembrar que o Fundamental Shift não segue nenhum estilo ou, pelo menos, se torna difícil encontrar algum do qual a música da dupla se encaixe. Mas para não quebrarmos a cabeça com isso, diremos que Muecke e Rasheed fazem o bom e velho rock’n’roll sem fronteiras e sem restrições, afinal, na arte há espaço para tudo. Voltando aqui à quinta música do álbum, ela possui uma atmosfera que te envolve vagarosamente e, quando se der por conta, já estará tomado.
Da música mais inquieta para a mais intimista, “Broken from the Inside” é uma execução tímida, quase implícita entre as outras desta relação. Aqui, os destaques estão nas vozes cujo trabalho ficou perfeitamente sincronizado. Este não chega a ser um tema ácido, mas é notável pela energia retraída que ele emite, em outras palavras, uma vitrine para quem aprecia música pela sua essência. Se você é uma pessoa que costuma pregar os ouvidos nas Dez Mais de programas de rádio, isto não te agradará, pois o que mede a qualidade aqui não são hits e, sim, exploração musical.

Agora, vamos de sentido contrário: acabamos de ouvir a música mais melancólica que agora abre alas para a mais pesada. O nome dela se chama “Pack for Mars” e beira um hard rock clássico mais performático. Aqui, a cozinha, preferivelmente a bateria, faz a festa com apoio de um teclado mais na base, e tudo soa de forma bem crua. Na sequência, “Phantasmagoria” chega trazendo um pouco de groove nessa mesma bateria, porém, acaba caindo nas linhas psicodélicas. Outro ponto legal é a linha de baixo, bem definida, elegante e rechonchuda. É interessante como esses dois caras constrói melodias de qualquer elemento.
A última dobradinha do disco vem com “From the Dream to Here” já trazendo belos efeitos e ótima sonorização vocal. Essa música nos faz imaginar que estamos saindo do alto mar ao encontro de uma praia com gaivotas sobrevoando o céu. Já a última, “The Dream Is a River”, é uma mistura de tudo que o Fundamental Shift apresentou aqui em mais de 13min de duração, um conceito épico avassalador. Resumindo, “If Seven Was A Number” não é apenas um álbum, é uma experiência sonora que nos guia através do tempo, para mostrar o quão infinita é a arte de fazer música.
Ouça “If Seven Was A Number” pelo Spotify:
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