Somente pessoas do nível de sensibilidade de Collin Thomas é capaz de absorver toda a temática de sua arte. O estadunidense é simplesmente fascinado pelo experimentalismo e expõe isso em sua música. Entretanto, não há abstrações em suas composições por mais que seus títulos sejam extremamente complexos. Em seu terceiro álbum de estúdio, “The Gauze Eyed Gaze Of Bracketed Air”, o texano fez questão de gravar dezesseis músicas, mas cada uma delas com dezesseis minutos de duração. Além disso, o disco foi pensado como um livro onde cada faixa representa um capítulo. Pode existir algo mais surreal do que isso no universo da música?
Quer mais curiosidades, o conjunto da obra envolve dois temas. O primeiro e mais evidente, até mesmo considerando as ilustrações, fala sobre as máscaras que o ser humano usa no dia a dia. Pensando nisso, o que se destaca mais é o tipo de máscara que algumas pessoas introspectivas ou não, usam para ocultar verdades. Um segundo tema está relativo a alguém que, por meio desses sons, expressa a dor e a tristeza ao ter que lidar com a demência de outra pessoa. Está achando complexo? Te dou uma dica, não busque entender, apenas confira o resultado.
Ainda assim, será improvável você iniciar a jornada desta audição e consegui-la chegar ao final, pois são mais de quatro horas de climas soturnos, melancólicos e alguns elementos que exigem boa percepção. No entanto, se a sua curiosidade for tão forte quanto o seu gosto por esse tipo de arte, poderá esmiuçar cada segundo das faixas e, descobrindo ao seu modo, o significado de cada uma delas. No entanto, é aconselhável também a visitação de outras obras de Thomas para se ter maior entendimento da plenitude de seu estilo e composições. Embora seus álbuns não sejam comerciais, existe um bom número de pessoas adeptas desse nicho.
Artista experimental há mais de vinte anos, o músico traçou este projeto com cuidado, injetando nele personalidade. Embora suas influências partam de nomes como Morton Feldman, John Cage, Alva Noto, Ryuchi Sakamoto e Taylor Deupree, é possível identificar a assinatura de Thomas em “The Gauze Eyed Gaze Of Bracketed Air”, como climas suaves e ao mesmo tempo tensos, ou notas de piano curtas, ligadas a longos intervalos. Mas você poderá descobrir muito mais nuances ao mergulhar nas trilhas sonoras. Comparo-as à degustação de um bom single malt escocês, onde os aromas e texturas estão embutidos no destilado.
A exemplo da primeira faixa “Early Onset”, onde você já confere os longos intervalos entre um acorde e outro, o disco segue enveredando a passos calculados o início da jornada. Na sequência, “The Walk” dá continuidade a esses paços, com a mesma serenidade e doçura de sua antecessora. Devemos lembrar que isto se trata de uma obra conceitual, sabendo disso a faixa “Is He Gone?” representa bem a pergunta do título, com sons de relógio e passos no chão. Assim como em “Escaping With An Apparition” e em quase todas as outras trilhas, você perceberá que Thomas usa sempre o mesmo acorde na introdução.
Com alguma diferença sutil na velocidade da execução, se formam algumas nuances. Em “The Doll Purchase”, por exemplo, o trecho inicial é bastante lento. Isso serve como dica para o que se ouvirá pelo resto da música, ou seja, muita cautela. Já a melodia escolhida para ser tema de um banquete em “The Wrong Banquet”, é bem mais vívida com uma sessão de violão. Na sequência, “New Ways Of Table Setting” traz uma nova introdução, mas mantêm o andamento soturno que lembra tristeza. Sentimento este ampliado por “Soft-Shell Venom”, que diz muita coisa no título.
Mais adiante, as habituais notas de piano chamam “Backup Reserves, Make The Call”, com alguns elementos de toques agudos, cristalinos e misteriosos. Durante a execução, o clima tenso aumenta até desaguar nos mesmos sons de piano. Quem também abre espaço para esse tema mais tecnológico é “Media Appreciated, In Due Time”, formando assim, uma dobradinha. Em seguida, “Minced, Frozen, Scorched” faz um reverse no tema, embora musicalmente a atmosfera seja a mesma. Porém, “Sign On The Line” não promove desprendimento emocional e, dessa forma, segue construindo uma boa atmosfera experimental. Trechos eletrônicos também são sentidos aqui, pois esses sons superam a barreira da audição.
O título “The Lies We Told” reflete muito uma das mensagens do álbum, pois mentiras sempre saem de alguém que usa máscaras. Musicalmente, há uma complexidade maior nesta faixa com tons graves mais evidentes. Agora, se procurarmos uma melodia mais acentuada, alguns momentos ‘jazz’ de “Fabrications: Her’s, Its, Our’s” nos dão essa resposta. Sua sucessora “Just Lunch”, no entanto, quase não possui forma harmônica explorando mais elementos sonoros. É o que também acontece em “Aphasia And Metacognition”, mas em doses menores de elementos sonoros. Para resumir tudo isso, eis aqui um álbum que desafia você.
Confira “The Gauze Eyed Gaze Of Bracketed Air” pelo Spotify:
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