Confira o magistral e multifacetado novo disco de Grace McLean

Para apresentar esta artista multifacetada norte-americana, basta mostrar seus prêmios. Grace McLean é escritora residente no Lincoln Center Theatre, onde seu primeiro musical original, “In The Green” recebeu o prêmio Richard Rodgers em 2020 e o prêmio Lucille Lortel de Melhor Atriz Principal em Musical.

McLean ainda recebeu o prêmio de melhor trilha sonora do Festival de Cinema de Brooklyn em 2021, e o prêmio Black Bear de melhor som (trilha sonora) no Festival Internacional de Cinema de Atenas em 2022. Não bastasse isso, a atriz e compositora tem sido sistematicamente elogiada pelas publicações Rolling Stone e New York Times.

Muitas vezes vemos isso como algo que conforte o artista, mas tem o lado que aumenta a responsabilidade. Responsabilidade, que ao ouvir o mais novo álbum de Grace, este “My Lovely Enemy”, sabemos que ela tem de sobra, pelo tanto de equilíbrio e maturidade que a artista de Nova York apresenta.

Produzido e gravado por Justin Goldner, mixado por Jack DeBoe (Jean Baptiste, Tyler the Creator, Yebba) e masterizado por Blake Morgan (Lenny Kravitz, Lesley Gore, Janita), o disco catapulta de vez Grace no cenário pop, mas trazendo uma amálgama de influências, além de, apenas através da música, representar diversas linguagens artísticas.

Isso porque, a interpretação vocal de McLean vai muito além de seu canto, seus timbres versáteis e do conceito musical. Ouvindo as noves faixas do disco, em sua quase meia hora, temos a certeza de uma atuação espetacular, onde dança e artes cênicas enriquecem o ambiente, que no caso é a nossa mente já invadida por esta obra-prima.

Não seria por menos, ela está atualmente na Broadway como presidente Woodrow Wilson em SUFFS, além de ter sido uma das Women to Watch do Broadway Women’s Fund (2021), membro do The Civilians R&D Group (2019-2020) e MacDowell Fellow (2018).

Logo, não é de se surpreender ao ouvir tanta coisa boa em apenas um disco, além de uma estrutura impecável e a produção que beira à perfeição. Porém, quando não se tem essas informações, é inegável que a satisfação seja surpreendente, pois não é sempre que nos deparamos com um álbum tão completo.

E ele começa com a faixa título, que já é magistral. Trata-se de um jazz moderno, que se mescla com o R&B, tendo groove e ritmo dançante, que teoriza todo o conceito pop da faixa. Nela, Grace já mostra uma interpretação fenomenal, deixando seu cartão de visitas.

Mas, não somente isso. Longe de ser a mais detalhada e intrincada do disco, “My Lovely Enemy” traz todos os elementos encontrados no álbum, como a banda convencional, os naipes de metais, além dos teclados discretos, mas certeiros. Nem todos estão na segunda faixa, a percussiva “Reckless”, que tem um trabalho intrincado em sua levada quebrada, com leves toques eruditos em seus arranjos.

E logo chega “Albertine”, o primeiro respiro do disco, com ar de balada, mas longe de ser piegas. Mais um show vocal de Grace, que aqui mostra um lado mais suave com linhas quase sussurradas, a faixa entrega um pop atmosférico baseado no piano e teclado, com leves pulsações, a faixa emociona e se intensifica em seu final.

Com uma estrutura que emula e remixa o clássico dos Rolling Stones “Satisfaction”, “Day Of Satisfaction” é mais uma composição de aula percussiva, mostrando o quanto a artista é influenciada pelo jazz. Nesta composição, Grace ganha reforço de metais pontuais, além de um baixo pulsante na medida certa.

Já em “Gazelle”, a aposta vem nos trabalhos vocais, com mais uma interpretação de arrancar o fôlego, além de incursões de corais ao fundo, que auxiliam no instrumental, dando um ar celestial que vai progredindo para ganhar um ritmo cadenciado a colocando dentro da new age.

E logo o soul pede passagem, pois “Living Light”, com Grace adotando seu tom suave, conduzindo uma música supostamente sutil, mas que ganha ritmo e se explode em uma canção dançante de alto nível, encarnando o pop atual, chega abalando. Enquanto isso, “Haven’t You Noticed” é uma canção mais vanguardista, se inspirando em clássicos dos anos 50, provando também o quanto Grace carrega de influências atemporais.

Entrando na reta final, a dançante, porém intimista “Ocean Vapor” traz esse lado mais imponente e obscuro da artista, sem perder sua graça e glamour. E ela fecha com chave-de-ouro, em “Everybody Loves”, que é quase que um ‘outro’ da faixa de abertura, mesclando um jazz com funk, onde o refrão em forma de coral foi uma das coisas mais assertivas que se tem no disco. Afinal, o tom de despedida não fica melancólico, pelo contrário, emociona e faz com que fiquemos com aquele gostinho de quero mais.

E, além dessa sensação, não tenha dúvidas que o prazer imediato é um dos principais sentimentos que temos ao ouvir uma obra tão riquíssima como “My Lovely Enemy”, pois a sensação de ter agregado algo a nossa cultura não tem preço.

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